
Reduzir para aumentar a produtividade? A matemática parece fugir da lógica, mas o modelo de jornada de trabalho com apenas 4 dias da semana está sendo testado em muitos setores com resultados promissores. Vamos ver alguns dos aprendizados das empresas que vêm adotando (ou pilotando) o modelo.
Mas primeiro: como é a jornada de apenas 4 dias na prática?
O modelo consiste em se trabalhar 4 dias por semana, com uma jornada de 8 horas por dia, totalizando 32 horas semanais. Na prática: os colaboradores realmente trabalham “menos”, e tem 3 dias de folga na semana. Mas tem muito mais envolvido.
Por que 4 dias de trabalho?
O primeiro a promover o modelo de forma estruturada foi o empresário e filantropo Andrew Barnes, fundador da empresa neozelandesa Perpetual Guardian.
Segundo ele, o tempo médio de produtividade diária de um colaborador é de 2 horas e 30 minutos, variando de país para país. Portanto, oferecer um dia extra de folga na semana, seria um super incentivo para os colabs aumentarem sua própria produtividade nos quatro dias restantes.
Ele usou sua própria empresa como projeto piloto, e, como previsto, o nível de produtividade dos colaboradores aumentou consideravelmente. O salário se manteve intacto e os benefícios oferecidos continuaram proporcionais à quantidade de dias trabalhados.
A partir daí diversas empresas começaram a experimentar e mensurar os impactos do encurtamento da semana de trabalho na produtividade dos colabs, como a Unilever, Shake Shack, Panasonic e a filial da Microsoft no Japão.
Um estudo realizado pela Universidade de Oxford, no Reino Unido, mostrou que a semana de 4 dias de trabalho não teve impacto negativo na produtividade das empresas participantes. Além disso, os colaboradores participantes do estudo relataram uma melhora na qualidade de vida e no bem-estar.
Cenário no Brasil
No Brasil, a semana de 4 dias de trabalho ainda é uma novidade, mas vem ganhando cada vez mais adeptos. Este ano o governo brasileiro anunciou um projeto piloto para testar o modelo em empresas de diversos setores. Cerca de 400 colaboradores de 20 empresas brasileiras vão participar do projeto, reduzindo a carga de trabalho de 40 para 32 horas semanais.
A ideia é seguir o mesmo método implementado em outros países, o “modelo 100-80-100”. Funciona assim: os colabs receberão 100% de seu salário, trabalharão 80% do tempo e têm o compromisso de manter 100% de sua produtividade. As empresas vão receber orientações específicas para lidar com a reestruturação da semana de trabalho, gestão de tempo e monitoramento das métricas.
Os resultados do projeto piloto ainda estão sendo aguardados, mas os primeiros resultados internacionais são promissores, com muitos relatos positivos de empresas e de colabs, que alegaram melhora na qualidade de vida, no bem-estar e na produtividade.
Por isso, é esperado que a semana de 4 dias de trabalho (ou formatos que se inspirem no modelo) continue a se popularizar no Brasil nos próximos anos.
Cases Made in Brazil
Dois cases brasileiros se destacam quando falamos da semana de 4 dias. Uma delas é a Zee.Dog, empresas de produtos para pets. Ela já oferece folga todas as quartas-feiras aos colaboradores, desde 2020. A mudança gerou um aumento de 20% na produtividade dos colaboradores.
Outro caso de sucesso é a Crawly, startup mineira no setor de extração de dados, que oferece um fim de semana de 3 dias desde que começou a funcionar, em 2017. Segundo o próprio CEO Pedro Naroga, a adoção do modelo aumentou muito o número de candidaturas e reduziu drasticamente o turnover. Tudo que o RH ama, não é mesmo?
Benefícios para os colabs
São muitos os benefícios que os colaboradores encontram no novo modelo de trabalho, atraindo sobretudo os talentos mais jovens, que buscam flexibilidade e equilíbrio entre vida profissional e pessoal.
Na prática, os colabs ganham:
Mais qualidade de vida: mais tempo para conviver com familiares e amigos, se dedicar a hobbies, ter acesso à cultura, investir em cursos de aprimoramento pessoal e profissional, descansar, aproveitar melhor os benefícios flexíveis da empresa, fazer uma pequena viagem, cuidar da saúde e muito mais. Com mais tempo livre, o colab volta mais feliz e com mais energia para o trabalho.
Menos estresse: O menor número de horas trabalhadas pode ajudar a reduzir o estresse e a ansiedade, visto que há mais equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. Isso é perceptível em semanais com feriado na segunda ou na sexta-feira, por exemplo. Já sabendo que a jornada será menor naquela semana, todos já se sentem mais leves e bem-dispostos.
Mais produtividade: Estudos tem demonstrado unanimidade em comprovar que a redução dos dias trabalhados na semana não reduz a produtividade dos colaboradores. Ao contrário, a maioria dos testes comprovam aumentos em até 20% na produtividade, como vimos no caso da Zee.Dog. Faz sentido, visto que os colaboradores estão mais descansados e motivados.
Benefícios para as empresas
O novo modelo é interessante por diversos motivos, especialmente para lidar com os principais desafios do RH. Veja como adotar a novidade pode beneficiar as empresas:
Retenção de talentos: a oferta do novo modelo é tão desejada entre os jovens profissionais (e não só), que por si só já é um diferencial de atração e um poderoso retentor de talentos. Depois de se acostumar com o equilíbrio de vida e um fim de semana de 3 dias, quem gostaria de voltar a um regime de 5 dias trabalhados?
Mais produtividade: como visto, a produtividade não só é “mantida” quando se trabalha menos, mas também pode aumentar bastante. Isso porque os colaboradores se sentem naturalmente mais motivados a dar seu melhor nos dias de trabalho.
Reforço da marca empregadora: A adoção da semana de 4 dias de trabalho pode ser vista como uma iniciativa inovadora e socialmente responsável, o que pode melhorar a imagem da empresa perante os clientes e investidores.
Redução de custos operacionais: um dia a menos de gastos com água, luz, materiais de escritório, café, etc impacta positivamente o orçamento mensal das empresas. Além disso, o VT e a alimentação da equipe inteira por um dia a menos na semana também reduz custos importantes.
Menos impactos ambientais: menos carros na rua, menos recursos consumidos, e menos poluição emitida são alguns dos impactos ambientais positivos de se trabalhar um dia a menos. De fato, se a semana de 4 dias for praticada por grande parte das empresas atuais, a previsão, segundo um estudo conduzido pela Platform London em 2021, é de que a nossa pegada de carbono poderia ser reduzida em até 20% até 2025.
O que diz a legislação trabalhista?
Perante a legislação trabalhista, a semana de 4 dias pode ser implementada por qualquer empresa que desejar, pois a CLT especifica somente que nenhuma empresa ultrapasse a carga horária máxima de 44 horas semanais. Cabe então ao empregador decidir se deseja oferecer uma jornada de trabalho menor.
Alguns pontos, porém, devem ser observados:
- Todos os colaboradores devem ter acesso à jornada reduzida de forma igualitária
- Não devem haver reduções nos benefícios obrigatórios
- O modelo só é benéfico para o colaborador se não houver redução do salário
- O piso salarial de cada área deve ser respeitado
- No caso dos benefícios flexíveis, as leis são as mesmas das empresas que praticam uma jornada de 5 ou 6 dias por semana
Na prática
A semana de 4 dias é muito promissora e está mais perto do que imaginamos. Mas também surgem muitas dúvidas. Como será a adaptação? É aplicável a todos os tipos de empresa? Como conciliar as agendas dos times e dos clientes?
Toda mudança exige tempo para ser implantada, testada e avaliada. E ignorar as tendências do futuro do trabalho também não é uma opção. Que tal começar com testes de aderência na empresa?
O Short Friday pode ser um bom exercício de entrada. Ter um horário reduzido na sexta-feira uma vez ao mês ou mesmo a cada semana é uma ótima forma de mensurar a adesão, colaboração e a produtividade dos colaboradores.
Dessa forma, sua empresa pode ir testando e tirando valiosos aprendizados. Assim, quando a realidade dos 4 dias for mais concreta, vocês já estarão preparados e saberão como agir melhor.
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